sábado, 21 de julho de 2012

BRÁS CUBAS: O DEFUNTO AUTOR DE MEMÓRIAS PÓSTUMAS


          Ao analisarmos a obra “Memórias Póstumas de Brás Cubas” a primeira coisa que nos chama a atenção, é  com certeza, a presença do defunto autor, que de fato, revolucionou a literatura nacional. O narrador, em primeira pessoa, presente nessa obra, coloca-se em uma posição posterior aos fatos narrados, marcada pela morte. É um defunto, que ora de forma memorialista, ora de forma autobiográfica, confidencia ao leitor passagens de  sua vida insignificante por este mundo.
            A opção por um narrador autodiegético, segundo a classificação dada por Genette, esse narrador que relata fatos de sua vida a partir de suas vivências dá a Brás Cubas a autoridade suficiente para manipular o tempo, a ponto de ele mesmo mostrar dúvidas quanto a iniciar a história por seu nascimento ou por sua morte: “Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias  pelo principio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar meu nascimento ou minha morte. (Cap 1)”
             O fato de o narrador ser o próprio Brás Cubas morto dá-lhe um posicionamento posterior aos fatos por ele narrados, suas próprias experiências de vida, deixando bastante evidente, o afastamento entre o presente do narrador – a morte – e  o passado da história – sua vida. Esse posicionamento dá ainda uma outra característica para o narrador da obra, e bastante comum em toda a obra do mestre Machado de Assis: o fato empregar um narrador intruso, invadindo a história  e emitindo opiniões e comentários sobre seus próprios atos; como em uma conversa direta com o leitor: “Imagine leitor, que no amamos, ela e eu, muitos anos antes, e que um dia, já enfermo, vejo assomar à porta da alcova... (cap.5)”
  É essa intromissão do narrador que aparece o tom irônico no texto, ao permitir que o leitor sejá confidente de um defunto mesmo estando ambos em tempo e espaço distintos. E dessa relação ficcional entre o real (leitor) e o irreal (defunto autor), resulta a interessante ironia de Machado de Assis ao confidenciar ao leitor que escreve por não ter o que fazer, evidenciando a chatice que parece ser a eternidade: “ - Não que ele me canse; eu não tenho o que fazer, e , realmente expandir alguns magros capítulos para esse mundo, sempre é uma tarefa que distrai um pouco da eternidade. (Cap 72)”
Enfim, como protagonista da história, Brás Cubas é amplamente conhecedor de tudo o que se passa e se passará ainda na narrativa; afinal, ele supostamente vivenciou o fato que narra. E é notável na narrativa o fato de que o Brás Cubas que narra não é o mesmo que vive o fato narrado. Vemos um narrador mais maduro, reflexivo, que, sábia e ironicamente usa sua condição de defunto para analisar sua passagem e ações sobre a terra.

Elizeu Domingos Tomasi

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